Há quase 10 anos, em uma das primeiras vezes que subi/desci a trilha que leva direto à Pedra da Mina via Paiolinho (Fazenda Serra Fina), notei uma bifurcação onde havia uma panela pendurada nas árvores e me questionei para onde ia essa trilha. E, mais que isso, olhando o local da bifurcação na carta topográfica (e anos mais tarde no google earth), me animava a possibilidade dela levar até o Pico dos Três Estados. Este ano chegou a hora de analisar essa hipótese e fazer acontecer.
Com a chegada da temporada de montanhismo/escalada e animado por já ter conseguido fazer bastante coisas este ano, chegou a hora de colocar em prática as ideias para a "Trilha da Panela". Assim, com o auxílio da carta topográfica e google earth, comecei a planejar o que poderia vir a ser um caminho da bifurcação até o Pico 3 Estados, 10ª montanha mais alta do Brasil de acordo com o Anuário Estatístico do IBGE, onde eu já estive 2 vezes.
Além do planejamento, tive também que recrutar alguns amigos para a dura empreitada. A primeira investida, em Junho, foi feita com o Jonas e Alcides e chegamos perto, muito perto de completar a trilha, mas tivemos que desistir por falta de tempo e água, a 2 horas do cume. O relato completo pode ser visto no link Trilha da Panela - Investida I.
Agora, para essa 2ª investida, com o Jonas e o Alcides fugindo da roubada, foi a vez de recrutar o Leandro e o Peter (e também o Bruno, que infelizmente acabou não conseguindo se encontrar conosco por causa das condições escorregadias da estrada que leva à Fazenda Serra Fina) para encarar a trilha e tentar concluir o projeto. Sendo assim, na 3ª feira busquei o Peter no metrô às 18h, o Leandro no seu trabalho às 18h20 e seguimos estrada rumo à Passa-Quatro.
A estrada foi tranquila, com apenas uma pausa para almoço na região de Roseira e no começo da noite estávamos passando por Passa-Quatro e começando a subir a estrada que leva ao bairro do Paiolinho (e fazenda Serra Fina). O começo foi tranquilo mas, devido a umidade, logo o carro começou a sofrer em algumas subidas, tendo que ir no embalo em algumas, de marcha-a-ré em outras ou não subir de vez, o que aconteceu a 250 m da fazenda (nessas horas eu sinto falta do Defender). Sem conseguir subir a rampa final, depois de várias tentativas, resolvemos bivacar por ali mesmo e no dia seguinte, quem sabe, tentar subir o restante com o carro.
No dia seguinte, 4ª feira dia 22 de Julho, acordamos às 6h, arrumamos as coisas e às 7h, horário que era para o Bruno já ter chegado, deixamos o carro e começamos a caminhar. Poucos minutos e estávamos assinando o livro na entrada da fazenda e seguindo nosso caminho trilha acima, pela trilha aberta que leva à Pedra da Mina.
No começo da trilha da Panela - pausa pra café da manhã
Alguns minutos de caminhada se passaram então fizemos nossa pausa pra café-da-manhã no 1º riacho da trilha. De lá, agora alimentados, seguimos mais um pouco pela trilha bem aberta e logo estávamos na bifurcação da panela, onde me surpreendi por não encontrar a antiga panela vermelha e furada mas sim, uma nova panela, também furada, em uma outra árvore (será que roubaram a panela antiga? Ela estava lá mês passado).
Bifurcação da trilha da panela
Na bifurcação mais uma breve pausa para fotos e vídeo e então saímos pela bifurcação que sempre chamava minha atenção. Neste trecho ainda há uma boa trilha, razoavelmente aberta, que leva até uma grande cachoeira, provavelmente visitada mais pelo pessoal da região já que nunca tinha ouvido falar sobre ela. Lá chegando, mais uma pausa curta, o Leandro quase mergulha em uma poça dágua (já adiantando o quanto nos molharíamos mais em frente) e logo começamos a subir, do outro lado do rio, a nova Trilha da Panela.
Mesmo com alguns trechos com o mato começando a crescer (principalmente bambus), a trilha estava bem aberta e visível, não causando nenhum problema para ser seguida e com uma progressão muito mais rápida que na investida anterior. Fomos seguindo e, às 10h, estávamos no que mês passado chamamos de "Cachoeira Verde", por estar no Rio Verde e com um grande poço que justifica seu nome. Lá aproveitamos para uma pausa um pouco mais longa, para comer algo antes de seguir nosso caminho.
Cachoeira do rio verde na Trilha da Panela
A partir desse momento a "trilha" é o próprio rio acima. Fomos seguindo, zig-zagueando o sobe pedra, desce pedra, contorna pedra, às vezes com água até as coxas até que, quase 2 horas depois, chegamos a uma outra grande cachoeira, onde deixamos o rio e seguimos a trilha que vai aos poucos subindo, mas acompanhando o rio ao nosso lado.
Meia hora se passou e chegamos então à crista de onde se vê a crista que sobe para o Pico 3 Estados, do outro lado de um profundo vale, com outras duas cachoeiras ao fundo (uma das ideias iniciais era atravessar este vale mas, na investida anterior, vimos que seria complicado de atravessar e seguimos o plano "B", seguir a crista que levava ao cume ao lado do 3 Estados).
A partir desse trecho a trilha fica bem mais inclinada e segue forte para cima. Fomos subindo e, às 13h30, chegamos no local onde havia bivacado mês passado (são pouquíssimos locais, na trilha inteira, onde é possível bivacar). Lá, animados por chegar na "hora do almoço" (em vez de chegar às 18h, como no mês passado), mais uma pausa para lanche e descanso até voltar a caminhar, como sempre, morro acima.
Descansando no local do bivac anterior na Trilha da Panela
De lá a trilha não segue mais tão aberta como antes mas ainda está razoavelmente visível e, nos trechos piores, onde tem os mares de bambus, continuava bem aberta e marcada. Fomos subindo e descendo os vários pequenos cumes do caminho até que, por volta das 16h, estávamos a uns 50 metros do local onde o Jonas e eu havíamos chegado na tentativa anterior.
Sem seguir muito para a direita, como o Jonas e eu fizemos mês passado, desta vez olhamos para o lado oposto e vimos o que parecia ser uma crista rochosa. Sabendo que o caminho direto seria muito fechado até o cume (fato observado anteriormente), decidimos então seguir para a crista na esperança de encontrar lajes de pedra que nos levasse ao topo.
Com o cansaço já batendo forte fomos seguindo, no começo atravessando muitos trechos fechados de capim elefante, até chegar nas rochas, onde tivemos uma vista animadora: muitas lajes seguindo para cima.
Com o Leandro na frente fomos subindo, priorizando sempre os trechos rochosos que, mesmo bem inclinados em alguns trechos, eram muito mais rápidos de seguir que a selva de capim elefante ao nosso redor (e que cortava nossa progressão entre algumas lajes).
Com o tempo chegando ao limite, e o clima não colaborando muito, fomos seguindo os trecos de rocha, vara-mato, rocha, vara-mato até que o trecho mais inclinado passou e as coisas começaram a ficar mais fáceis. De lá mais alguns minutos e então chegamos, finalmente, ao cume ao lado do Pico Três Estados, por onde passa a travessia da Serra Fina. Foi muito animador ver um vestígio humano (um totem) e saber que tínhamos conseguido o planejado.
Cume do Pico 3 Estados com chuva depois da Trilha da Panela
De lá, com as últimas luzes do dia, seguimos pela trilha super aberta da Serra Fina até o cume do Pico Três Estados, onde chegamos às 18h. Cansados mas muito felizes por concluir a trilha, arrumamos nosso local de bivac em uma das clareiras do cume, preparamos nosso jantar e finalmente entramos nos sacos de dormir para uma boa noite de sono.
A noite foi bem tranquila, quente, seca e conseguimos dormir muito bem. Às 6h o despertador do celular tocou e, junto com ele, chegou uma forte neblina, que logo virou uma garôa, e molhava de verdade. Como se tivéssemos levado um chute no saco com alguém dizendo: "vai, não queriam roubada?" tomamos café da manhã, começamos a arrumar as coisas e, já molhados e com as mochilas molhadas nas costas, começamos nosso caminho de volta, também pela Trilha da Panela (na noite anterior até cogitamos voltar pela Pedra da Mina, mas isso esticaria em muito a caminhada e achamos melhor voltar por onde tínhamos ido).
Cume do 3 Estados antes da descida da Trilha da Panela
Às 7h começamos a descida pela trilha da Serra Fina e logo chegamos ao cume de onde "despenca" a recém aberta Trilha da Panela. Navegando por equipamentos (leia-se usando o GPS bastante porque a neblina não nos deixava ver muito o caminho a seguir) começamos a descida tentando seguir exatamente o mesmo caminho que tínhamos subido (ninguém queria ter que varar outro mar de capim elefante nem de bambus).
Mesmo com o clima ruim, deixando muitas lajes escorregadias, a descida foi mais rápida que a subida e, quanto mais descíamos, melhor o clima ficava. Aos poucos atravessamos os 4 pequenos cumes da crista e então descemos até o ponto de onde se vê as cachoeiras e sai da crista. Lá uma pausa para lanche e, 30 minutos depois, já estávamos de volta ao Rio Verde, de onde seguiríamos, mais uma vez, pelo seu leito.
Com o clima molhado o nível do rio tinha subido um pouco e o fluxo estava mais forte (nunca tente essa trilha se tiver previsão de chuva forte, não há como escapar do rio) e acabamos levando um bom tempo (cerca de 2 horas) até chegar na Cachoeira do Poço Verde, onde fizemos mais uma pausa pausa para lanche.
Sabendo que o final da trilha estava cada vez mais próximo seguimos trilha acima e chegamos então até a grande cachoeira, de onde a trilha melhoraria mais ainda. Mais alguns longos minutos de caminhada, animados por saber que cada vez o caminho ficaria melhor, chegamos então à bifurcação da Panela, cansados mas com a missão cumprida e, principalmente, sem ninguém se machucar (pelo menos seriamente), já que o relevo era bem complicado.
De volta à Panela depois da abertura da Trilha da Panela
Depois de uma breve pausa para comemorar e fazer um vídeo final seguimos nosso caminho, agora pela aberta trilha do Paiolinho, seguindo os 3 km até a Fazenda Serra Fina em pouco menos de 1h, chegando no carro às 15h50, 7h50 depois da nossa saída do cume do 3 Estados.
No carro finalmente pudemos trocar as roupas molhadas por algo seco e então seguimos nosso caminho de volta à civilização, cansados mas felizes de termos completado este projeto que me atiçava há muitos anos.
No retorno uma pausa para calibrar os pneus antes de descer a serra (e já pensando no próximo projeto que será exatamente ali) e, já na Dutra, pausa para nosso almoço-janta em Roseira, em um restaurante que já estou bem acostumado de frequentar. De lá mais alguns longos quilômetros até Bom Jesus dos Perdões (ao lado de Atibaia), onde mora o Peter, mais pouco mais de uma hora até São Paulo e, umas 21h20, finalmente estava em casa para o merecido banho e descanso.
Este ano está sendo muito bom para meus projetos de montanha. Em Abril, com o Jonas e o Lucas abrimos a Travessia Davi-Parofes e, agora em Junho e Julho, com o Jonas, Alcides, Leandro e Peter foi a vez da Trilha da Panela. E os projetos do ano não acabaram. Espero, ainda este ano, completar pelo menos mais um deles, de uma montanha que tentei ano passado com o Mateus mas que não conseguimos completar. Que a temporada continue como está!